- Pai, eu te perdoo. Eu te perdoo de todo meu coração. Todos nós te perdoamos. Por favor, me perdoe também.
Lágrimas escorrem por seu rosto. Ele se aproxima de mim, abre os braços e me oferece um abraço.
Eu o abraço, sinto suas mãos e inspiro o cheiro doce. Inspiro todos os anos passados, o sorriso de minha mãe, a tagarelice da minha irmã, o nosso jardim, o balanço e a casa pobre. Todos os passeios no nosso Fiat e os anos roubados por Azra.
Sua voz, que não ouço há tantos anos, de repente enche a sala.
- Está tudo bem, meu filho. Está tudo certo, não tenho nada pelo que te perdoar.
Então ele desaparece. E com ele, o cheiro.
- Pai?
Não recebo resposta.
De repente sou preenchido de vazio e saudade, mas esses sentimentos não são nada comparados ao alívio que se abre como um poço em minha consciência, um poço no qual toda a culpa, remorso e tristeza afundam, embora eu saiba que a mina deixou cicatrizes de terror em mim e que algo ainda a assombra.
O telefone está na mesa. Eu pego e disco um número, agora não quero ficar sozinho.
- É tarde demais para mim?
Não recebo a resposta de imediato, ela fica bastante surpresa.
- Claro que não, apresse-se, estou tão feliz.
Desligo, me arrumo e procuro papai, mas não o encontro.
Ele se foi para sempre.
Mas a vida ainda existe e a felicidade também. Eu sei o que fazer.
Apesar do poço de mineração K-14, Azra.