Merk fica tenso quando o líder dos ladrões se aproxima, não porque ele o teme; Merk poderia matá-lo – poderia matá-los em um piscar de olhos, se assim desejasse. O que o deixa tenso é a possibilidade de ser forçado a praticar um ato de violência. Ele está determinado a manter seu voto, custe o que custar.
"E o que temos aqui?" Pergunta um deles, aproximando-se, rodeando Merk.
"Parece que um monge," diz outro, em tom de zombaria. "Mas essas botas não combinam."
"Talvez ele seja um monge que pensa que é um soldado," fala outro.
Todos eles caem na gargalhada, e um deles, um idiota de um homem na casa dos quarenta anos com um dente da frente faltando, inclina-se com seu mau hálito e cutuca Merk no ombro. O velho Merk teria matado o homem que ousasse chegar tão perto.
Mas o novo Merk está determinado a ser um homem melhor, a se elevar acima da violência, mesmo que ela pareça persegui-lo. Ele fecha os olhos e respira fundo, obrigando-se a manter a calma.
Não recorra à violência, ele diz a si mesmo uma e outra vez.
"O que é este monge está fazendo?" Pergunta um deles. "Orando?"
Todos caem na gargalhada novamente.
"Seu Deus não vai te salvar agora, garoto!" Exclama outro.
Merk abre os olhos e olha para o cretino.
"Eu não quero machucá-lo" ele diz calmamente.
As risadas ficam ainda mais altas do que antes, e Merk percebe que ficar calmo e não reagir com violência é a coisa mais difícil que ele já tinha feito.
"Sorte para nós, então!" Responde um deles.
Eles riem de novo, então todos ficam em silêncio enquanto o líder se adianta e para diante de Merk.
"Mas talvez," ele fala com a voz grave, tão perto que Merk pode sentir seu mau hálito, "nós queremos machucá-lo."
Um homem se aproxima por trás Merk, passa um braço em torno de sua garganta, e começa a apertar. Merk engasga quando começa a ser sufocado, o aperto é forte o suficiente para causar dor, mas não para cortar todo seu ar. Seu reflexo imediato é esticar o braço e matar o homem. Seria fácil; ele conhece o ponto de pressão perfeito no antebraço para fazer com que o bandido o solte. Mas ele se obriga a não fazer nada.
Deixe-os passar, ele repete para si mesmo. O caminho para a humildade deve começar em algum lugar.
Merk enfrenta o líder.
"Peguem o que desejarem," diz Merk, ofegante. "Peguem o que quiserem e sigam o seu caminho."
"E se nós pegarmos o que quisermos e quisermos continuar aqui?" O líder responde.
"Ninguém está perguntando o que podemos ou não podemos fazer, garoto,” diz outro.
Um deles se adianta e pega os itens na cintura de Merk, vasculhando seus bolsos com mãos gananciosas à procura dos poucos pertences que ele ainda possui. Merk se obriga a manter a calma enquanto aquelas mãos vasculham os seus pertences. Finalmente, eles extraem sua adaga revestida de prata, sua arma favorita e Merk, ainda assim e por mais doloroso que seja, não reage.
Deixe, ele diz para si mesmo.
"O que é isso?" Pergunta um dos bandidos. "Uma adaga?"
Ele olha para Merk.
"O quê um monge extravagante como você está fazendo com um punhal?" Pergunta um deles.
"O que você está fazendo, menino, esculpindo árvores?" Pergunta outro.
Todos riem, e Merk range os dentes, se perguntando quanto mais ele poderia suportar.
O homem que havia tirado a adaga dele para, olha para o pulso de Merk, e puxa a manga de sua túnica para cima. Merk se prepara, sabendo que eles haviam encontrado.
"O que é isso?" Pergunta o ladrão, segurando seu pulso para examiná-lo.
"Parece que é uma raposa," um deles responde.
"O que é um monge fazendo com uma tatuagem de uma raposa?" Pergunta outro.
Outro homem dá um passo à frente, um homem ruivo, alto e magro, que agarra seu pulso e o examina de perto. Ele solta o braço de Merk e olha para eles com um olhar cauteloso.
“Isso não é raposa, seu idiota," ele fala para seus homens. "É um lobo. É a marca dos homens do rei – ele é um mercenário."
Merk sente seu rosto corar quando ele percebe que eles estão olhando para sua tatuagem. Ele não queria ser descoberto.
Os ladrões permanecem em silêncio, olhando para ele e, pela primeira vez, Merk sente a hesitação em seus rostos.
"Essa é a ordem dos assassinos," um deles fala, em seguida, olha para ele. "Como você conseguiu essa marca, menino?"
"Provavelmente ele mesmo a fez," um dos bandidos responde. "A marca deixa a estrada mais segura."
O líder acenou para seu homem, que solta a garganta de Merk, que respira fundo, aliviado. Mas o líder então estende o braço e segura a faca na garganta dele, e Merk se pergunta se iria morrer ali, hoje, naquele lugar. Ele se pergunta se aquele seria sua punição por toda a matança que tinha feito. E se pergunta se ele está pronto para morrer.
"Responda a pergunta," o líder dispara. "Você fez isso em si mesmo, rapaz? Dizem que é preciso matar uma centena de homens para conseguir essa marca."
Merk respira e, durante o longo silêncio que se segue, reflete sobre o que dizer. Finalmente, ele suspira.
"Mil," ele fala.
O líder continua olhando para ele, confuso.
"O quê?" ele pergunta.
"Mil homens," explica Merk. "É então que você recebe a tatuagem. Ela me foi dada pelo próprio Rei Tarnis."
Todos olham para ele, chocados, e um longo silêncio cai sobre a floresta, que fica tão silenciosa que Merk pode ouvir o barulho dos insetos. Ele se pergunta o que aconteceria em seguida.
Um deles dá um riso histérico e todos os outros o seguem. Eles riem enquanto Merk fica ali, claramente pensando que aquilo é a coisa mais engraçada que já tinham ouvido.
"Essa é boa, rapaz," diz um deles. "Você é tão bom mentiroso quanto você é um monge."
O líder empurra o punhal contra sua garganta, com força suficiente para começar a tirar sangue.
"Eu lhe disse para responder a pergunta," o líder repete. "Diga a verdade. Você quer morrer agora, rapaz?"
Merk fica ali, sentindo a dor, e considera a pergunta – ele realmente pensa em sua resposta. Será que ele quer morrer? É uma boa pergunta, uma pergunta ainda mais profunda do que o ladrão supunha. Enquanto pensa sobre isso, realmente considerando como responder, ele percebe que uma parte dele quer morrer. Ele está cansado da vida, cansado de tudo aquilo.
Mas, ao continuar pensando, Merk em última análise percebe que não está pronto para morrer. Não agora, não hoje. Não quando ele está pronto para começar de novo. Não quando ele está apenas começando a aproveitar a vida. Ele quer uma chance de mudar. Ele quer uma chance para servir na Torre, e se tornar um Vigilante.
"Não, na verdade não quero," Merk responde.
Ele finalmente olha diretamente nos olhos de seu captor, sentindo uma vontade crescente dentro dele.
"E por causa disso," ele continua, "eu vou lhe dar uma chance para me soltar, antes que eu mate todos vocês."
Todos olham para ele em choque e silêncio, até que o líder faz uma careta e começa a partir para a ação.
Merk sente a lâmina começar a cortar sua garganta, e algo dentro dele o força a agir. É o seu lado profissional, algo que ele havia treinado durante toda a sua vida, uma parte dele que ele não consegue mais controlar. Aquilo significaria quebrar seu voto, mas ele não se importa mais com isso.
O velho Merk assume o controle rapidamente, como se nunca tivesse sido abandonado – e em um piscar de olhos, Merk se vê mais uma vez no modo assassino.
Merk se concentra e consegue enxergar todos os movimentos de seus oponentes, cada contração, cada ponto de pressão, cada vulnerabilidade. O desejo de matá-los toma conta dele, como um velho amigo, e Merk permite que ele assuma o controle de suas ações.
Em um movimento extremamente rápido, Merk agarra o pulso do líder, enfiando o seu dedo em um ponto de pressão, e torce o braço dele até ouvir um estalo; em seguida, ele pega a adaga quando ela cai e com outro movimento rápido, corta a garganta do homem de orelha a orelha.