Franco Susana - A Lista Dos Perfis Psicológicos стр 6.

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― Nada, assim também não dá para ver. ― Afirmei após tentar observá-lo de vários ângulos.

Estava entretido naquilo quando a rua se começou a iluminar e reparei que um carro se aproximava. Guardei depressa o pedaço de papel e fui tentar pará-lo.

― Táxi! Táxi!… ― Gritei, enquanto abanava as mãos no ar para que me visse.

― Precisa de um táxi, senhor? ― Perguntou o condutor, parando do meu lado.

― Sim, obrigado ― afirmei aliviado enquanto entrava para a parte traseira do carro.

― Para onde quer ir?

― Para o Hotel Plaza.

― Teve sorte de eu passar por aqui, não é uma zona muito recomendável.

― Pois, estou a ver que não ― eu disse, vendo que se tratava de um bairro negligente.

― Está cá de visita? ― Perguntou o taxista.

― O quê? ― Devolvi, enquanto observava o bairro que atravessávamos.

― É a sua primeira vez cá na cidade? ― Insistiu.

― Não, eu moro cá.

― Onde? No hotel? ― Perguntou o taxista num tom de brincadeira.

― Sim, isso mesmo. ― Afirmei decisivo.

― Desculpe, mas não estou a perceber ― disse o homem surpreendido.

― Há anos que vivo lá, e dessa forma posso concentrar-me no meu trabalho sem a necessidade de me distrair com coisas desnecessárias como as lidas domésticas.

― Que trabalho pode ser assim tão absorvente? ― Perguntou o taxista curioso.

― Sou psiquiatra ― respondi, enquanto baixava a gola do casaco.

― Psi… quê? Dos loucos? ― Perguntou, soltando uma gargalhada.

― Aquele que trata da saúde mental dos cidadãos desta cidade ― salientei sem me deixar afetar por aquele comentário jocoso, que nem sequer era dos mais ofensivos que já tinha suportado.

― Bem, não interessa, e isso dá-lhe para viver num hotel? Você deve ganhar bem ― ele disse, enquanto fazia um gesto com os dedos indicador e polegar, indicando dinheiro.

― Nem por isso, mas como não tenho outros gastos, posso-me dar a esse luxo.

― Ah! Sim, estou a ver! ― Afirmou o taxista, mostrando um sorriso brincalhão.

― Se você fizesse contas do que gasta com o aluguer ou hipoteca, mais os gastos de luz, água, seguros e comida, provavelmente optaria por uma solução como a minha ― afirmei, fazendo-o ver as vantagens daquilo.

― Se dissesse à minha mulher que íamos viver para um hotel, a primeira coisa que ela me perguntaria era se tinha ganhado a lotaria ― o homem brincou.

― E a segunda? ― Perguntei, seguindo a sua piada.

― O que faria com a minha sogra. ― Respondeu às gargalhadas.

― Tem uma família grande? ― Perguntei intrigado.

― Grande? Se contar com a minha mulher, a minha sogra, os tios e os primos, sim. Quando nos reunimos todos, somos dez. E vem outro a caminho. E você, não é casado? ― Perguntou divertido.

― Não. Quer dizer, já fui, mas ela abandonou-me.

― Ah, lamento ― afirmou o taxista, mudando de tom.

― Não lamente, ela fugiu com outro enquanto eu estava num congresso.

― Está a falar a sério?

E começamos os dois a rir daquela situação tão absurda. Até que se seguiu um momento de silêncio, quase tão desconfortável como o que senti quando voltei para casa naquele dia e encontrei o bilhete de despedida da minha mulher, a dizer: “Espero que consigas tudo o que queres, eu também vou tentar, por isso vou-me embora”.

Eu andava sempre com o bilhete na carteira, para todo o lado que ia, mas ainda não tinha chegado a mostrá-lo a ninguém, talvez por vergonha ou por medo de partilhar os meus sentimentos. Era óbvio que ela não era feliz comigo e que queria “explorar novos horizontes”.

Assim, quando cheguei a casa, e após dar-me conta da situação, peguei na mala que trazia comigo do congresso e fui para o Hotel Plaza, onde me deixei ficar até hoje.

Não me via a viver naquela casa sem ela. Tanto silêncio, tanta solidão, naquela casa que tínhamos comprado com tanta expectativa. Onde íamos ter os nossos filhos, vê-los crescer, e que seria a nossa morada até os últimos anos das nossas vidas. E com apenas dois anos de casamento, tudo acabou desta forma. Sem um único telefonema ou uma explicação, apenas com um bilhete de despedida.

É verdade que os últimos meses tinham sido bastante agitados para mim, centrados num novo projeto – ser um dos cofundadores de uma associação internacional de psiquiatras, onde pretendíamos oferecer uma nova perspetiva às pessoas alheias à nossa ciência; publicar uma revista trimestral; arranjar financiamento para projetos de investigação; atender os meus pacientes… – e com tudo isso, acabei por me descuidar daquilo que mais queria, mas para o qual não tinha recebido nenhum sinal.

Sempre que voltava para casa, ela parecia feliz e satisfeita. Falava-me sobre o seu trabalho como professora, das dificuldades que por vezes tinha, ou de como alguma das crianças lhe tirava do sério.

Lembro-me até de que já tínhamos feito planos para nas próximas férias passarmos umas semanas numa dessas ilhas tropicais, cheias de cocos e praias de areia branca, onde o mar se confunde com o céu, e onde pudéssemos estar os dois juntos, a partilhar daquele pedacinho de céu cá na Terra. E de repente, de um dia para o outro, restou apenas um bilhete.

― Chegámos! ― Disse o taxista ao parar em frente à entrada principal do hotel.

― Obrigado! ― Respondi, pagando-lhe pela corrida e saindo do carro.

― Boa noite! ― Saudou o porteiro do hotel.

― Boa noite! ― Respondi enquanto subia novamente a gola do casaco e entrava no hotel com alguma pressa, uma vez que o tempo tinha começado a arrefecer.

Depois de subir as escadas, cruzei a porta giratória e dirigi-me à receção.

― Boa noite, quarto 311. Tem correspondência para mim? ― Perguntei enquanto esperava que me dessem a chave do quarto.

― Não doutor, mas aqui tem os jornais de hoje, tal como pediu.

― Muito obrigada! Boa noite ― respondi enquanto recolhia os jornais internacionais aos quais gostava de dar uma vista de olhos antes de me deitar.

― Qual é o andar? ― Perguntou o rapaz do elevador.

― O terceiro. ― Afirmei, sabendo que ele já sabia a resposta, pois todas as noites fazia-me a mesma pergunta.

― Teve um bom dia? ― Voltou a perguntar o rapaz.

― Bom, foi uma tarde um pouco invulgar!

― Por causa do tempo?

― Sim, também ― respondi com um sorriso forçado.

― Já chegámos! Tenha uma boa noite.

― Muito obrigado, vou tentar ― falei, saindo do elevador e dirigindo-me ao meu quarto.

Ao fundo do corredor, havia uma pequena suite, que disponha de um pequeno escritório e de um quarto. Não era muito grande, mas era o melhor que tinha conseguido negociar com o diretor do hotel, já que não era habitual terem clientes alojados no mesmo quarto durante anos.

Mal abri a porta da suite, percebi que alguma coisa não estava bem. Um cheiro forte a charuto inundava a sala, algo que era óbvio que não era meu, pois eu não fumava, e muito menos recebia convidados no meu quarto, pelo que não pude evitar soltar um:

― Quem está aí?

Tentei ligar o interruptor, mas os candeeiros não acendiam, embora tivesse pressionado repetidamente a chave da luz.

― Não se preocupe doutor, está tudo bem. ― Disse uma voz vinda da minha poltrona.

Tinha passado tanto tempo naquela sala que era capaz de reconhecer cada canto e sabia bem que, no lugar de onde me falava, havia uma poltrona debaixo de um candeeiro de pé, lugar onde costumava sentar-me a ler os jornais antes de dormir.

― Quem é você? ― Perguntei, dando um passo atrás e dirigindo-me até à saída para abrir a porta e poder, pelo menos, iluminar o quarto.

Estava prestes a fazê-lo, já com a mão na maçaneta, quando notei que alguém a prendia, impedindo-me de puxar a maçaneta.

― Acalme-se, por favor! Se lhe quisesse fazer mal, não estaríamos aqui a falar.

De repente, fez-se luz atrás de mim. O homem que falava comigo, tinha acendido o candeeiro e com isso, notei como outro, encasacado e com luvas, prendia-me a mão com as suas duas mãos.

Soltei-me e voltei-me para protestar por aquela invasão de privacidade, pois, embora assim não fosse, considerava aquele espaço a minha casa.

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